quinta-feira, 14 de junho de 2012

e não precisa de selo

querido Passos Coelho,

alerto-te, desde já, que escrevo - e escreverei - sempre sem resquícios do novo acordo ortográfico mas com ironia que baste: de outra forma, seria obrigada a substituir querido por cabrão. escrevo-te hoje por resolver fazer um balanço. minto. escrevo-te porque acordei com vontade de purgar o meu descontentamento e não encontro melhor destinatário para a minha carta que não tu - tu és o meu saco de boxe, a minha bacia de limpeza linfática, o meu rolo de papel, preferido; quem melhor do que tu perceberá a minha frustração, o meu lamento e a minha gana de justiça? és, portanto, um privilegiado por também seres um construtor de ideias falido, um mentor do think tank de nicles, um apoiante à ajuda externa, vai-se o azeite e vem-se o vinagre, com picles.

hoje acordei e fui à janela ver se as finanças estavam estabilizadas e apanhei com a cagadela de uma pomba fodida com a vida.

hoje acordei e fui à rua, a correr, ver a alegria dos mais necessitados: fui assaltada por esticão e, de seguida, atropelada por um assaltante de carros em fuga.

hoje acordei e ainda estou de olho no crescimento da economia e do emprego. e sabes que mais? ainda não tomei o pequeno almoço por preguiça e marasmo - a padaria que fica mais perto também já fechou e os bons padeiros devem estar a coçar a pulga no centro de emprego da póvoa de varzim.

mas se eu vivesse em massamá, não escrevia aqui nem acolá: tocava na tua campaínha e, sem esperança que me abrisse a porta a das doce, a ex-bem-bom, tinha uma olho-no olho contigo, conversa de pé de orelha, onde soltava a minha língua fugidia e havias de torcer o rabo à porca. faria, assim, uma espécie de cozido à portuguesa, com ares de selecção, porque afinal o que é nacional é bom, e metia-te um frango dos de verdade por não me falhar a vontade.

com pimentos e sardinhas porque os santos não vacilam,

Olinda

(agora vou ver se chove, que é para colocar bacias a apanhar desperdício de água para as descargas)