domingo, 10 de julho de 2011

s. quase milagreiro

o que distingue um português de um outro qualquer é o quase: o português é aquele que corre mas que quase ficou aleijadinho com o acidente que teve; ou o que continua solteiro mas namorou muito tempo e quase casou; ou a auxiliar que quase acabou o curso e foi quase médica; ou o que está bem vivo e quase morreu de ataque cardíaco; ou o que continua teso como um carapau mas quase que acertou no euromilhões; ou o que se tivesse feito e não fez quase que foi feliz. o quase é, portanto, uma espécie de imagem de relaxação, uma espécie de passado potenciado em futuro que serve de consolo ao presente, uma inesperança que dura e dura e dura.

ouve, isto que estou a dizer é mesmo interessante - esta inesperança portuguesa é a única que não é quase. a inesperança é mesmo um placebo da certeza da desesperança e, por isso, milagreira. quase que arrisco dizer que, português que é português, faz e assiste a um milagre todos os dias. até o José quase que podia ter sido  reeleito se o povo não o tivesse posto no lixo; até eu quase que podia ter comido mais ao pequeno-almoço se não pensasse tanto. na verdade, a verdade é que eu rio de contente por estar a escrever com fome e o José chora de tristeza por saber que se fosse ele o lixo a coisa cheirava melhor.


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